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OS CAMPOS DO RACISMO

Atualizado: 27 de mai. de 2023



Numa semana marcada pela agressão racista que o jogador Vinicius Jr sofreu por parte de grupo de torcedores do Valência, na Espanha, me sinto convocado a refletir: o que sustenta culturalmente e psicologicamente essas condutas?

Ainda que isso seja recorrente no futebol Espanhol (Ronaldo passou pelo mesmo, quando era centroavante do Real Madrid, foi injuriado por torcedores do Málaga), não vamos ficar projetando somente neles o que é de nossa cultura ocidental escravocrata e racista.

A injúria racial, agora equiparada ao crime de racismo pelo Direito Penal, sendo imprescritível e inafiançável, é ferramenta de justiça importante. Entretanto, não é suficiente para conter os atos que ser revelam constantemente.

O bolso sempre é o lugar mais sensível e mexer nele ajuda: A exemplo, a multa de U$ 100 mil dólares que a CONMEBOL ao Nacional-URU pelos gestuais racistas de seu jogares contra os dos Inter, na 3ª rodada do Grupo B da Libertadores.

Conceitos característicos da psicanálise Lacaniana ajudam-me a pensar essa questão que sustenta a atuação e conduta dos racistas.

- O Real: no caso, tem uma pretensa superioridade genética que não se sustenta cientificamente. Tampouco estética.

- O Imaginário: uma percepção de uma autoimagem de que o branco é o “puro”, com vertentes claramente nazifascistas. Bem como, um pé num delírio paranoico megalomaníaco. (Meu professor na Psicologia da UFRGS, Norton Rosa, apostava que Hitler seria não um psicopata mas um paranoico com os judeus).

- Simbólico: Falar, ostentar seu preconceito com significantes pejorativos é uma necessidade dos preconceituosos, numa tentativa de dar conta de algo que na singularidade de cada um é insuportável, por não saberem simbolizar o que realmente os incomoda.

O racismo estrutural pode ser bem mais entendido com esses olhares. Na estrutura Bohomeana, que envolve os conceitos citados. Ainda temos o furo no centro (objeto a), algo que foi perdido. Bom tema para pesquisa clínica. O que está de todo perdido para cada racista causar danos morais e físicos ao outro por ser preto?

Ainda é considerável que o filósofo Nietzsche se referia à “alma alemã” multirracial, com predominância dos pré-arianos. Hitler inverteu essa perspectiva, que não era racista nem nacionalista.

Ilustres pesquisadores como Paul Broca, fundador da antropometria, e o antropólogo Alfredo Binet tentaram correlacionar uma herança racial nas diferenças físicas: tamanho do crânio, antebraço etc. Eles nada conseguiram provar, abandonando essas ideias preconcebidas.

Binet, criador do teste de “QI”, que não visava uma discriminação racial, teve seu trabalho deturpado por psicólogos americanos que também visavam uma prova que brancos eram superiores aos asiáticos e africanos e que europeus do norte eram superiores que os do sul.

E no campo da genética, temos provas de que o conjunto de genes que são responsáveis pela vida humana é o mesmo para todos, independentemente das diferenças raciais.

Fundamental é considerarmos que todo tipo de violência - a racial não está fora - é facilitada no contexto grupal, no qual o indivíduo autoriza-se a fazer o que sozinho não teria coragem.

Segundo Freud, em grupo, o sujeito fica submisso à emoção, que se intensifica, com redução da capacidade intelectual. As pulsões violentas são desinibidas e, evidentemente, tem fatores da singularidade literalmente “em jogo”.

Essas passagens aos atos perversos se caracterizam, portanto, a uma falta de supereu, que desmente os avanços jurídicos no combate ao racismo, num gozo pulsional que não vê os riscos.

Portanto, não basta uma judicialização do crime racial: precisamos de uma psicoeducação permanente que passe pelos também pelo campo familiar, escolar, curricular. Que as escolinhas de futebol possam fazer esse trabalho de desarticulação do preconceito racial.

Temos um exemplo educacional de vanguarda, em Salvador, Bahia: A Escola Afro-brasileira Maria Felipa, primeira proposta no país, do infantil ao ensino fundamental, trilíngue, inglês, português e Libras (um aspecto a mais de integração). Foi idealizada pela escritora e professora, doutora pela IQ/UFBA Barbara Carine (@escolamariacarine).

No nosso “campo clínico, psicológico, psicanalítico”, estamos querendo fazer gols contra o racismo e o sofrimento psíquico dele decorrente. E os negros fazem parte do grupo que estamos focando no trabalho virtual em nosso site Psi - psicoterapia online - http://clinicapsi.org/.


Gaio Fontella é Psicólogo, psicanalista, debatedor do Café com Análise no YouTube

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