Nossa civilização ocidental, pelo que leio e vejo, tem dificuldades de lidar com o envelhecimento. É um terror ter que assistir cenas de publicidade, apelando ao consumismo, para vender produtos de beleza que garantem a “eterna juventude”. E agora este papo de “geração prateada”. Outro engodo.
O tema da morte, da finitude, do passar da vida é dramático para nossas gentes. Chegando a certa idade, sem preparação para a aposentadoria, sem plano de finanças para viver com dignidade, pela pobreza, pelas condições sociais, vivemos no Brasil o drama da depressão. Sei que não se trata de um fenômeno local.
Faz algum tempo que comecei a me interessar pela temática, primeiro como vereador, para tentar representar um pouco estas pessoas, depois por circunstâncias não planejadas de ter que cuidar de minha mãe, hoje nonagenária, e é claro por mim, pois me dei conta que era uma pessoa idosa. Aos 60 anos voltei a estudar, fui cursar a Faculdade de Direito e ali minha consciência se aguçou com a vivência intergeracional.
Além disso, instigado por uma amiga, começamos a pensar em fazer algo pelos chamados 60+. Conversa vai, conversa vem, entre um café e outro, acabamos por decidir reunir um grupo de pessoas que, com experiência, pudessem falar do envelhecimento, surgindo então o livro “Metamorfose da vida”, volume 1, com as enchentes surgiu o “Perdi tudo, e agora?” e mais recentemente o volume 2 de “Metamorfose da vida, a arte de envelhecer”.
Cuidar da minha mãe me trouxe ensinamentos variados, entre eles de que é necessário ter paciência, resiliência, solidariedade e compreensão com o Outro. Mais difícil ainda porque ela vem da roça, do interior, cidade pequena. Eu passei mais de 40 anos longe dela. Vivi e me formei numa grande cidade. Tornei-me uma espécie de cidadão do mundo. Que lições tomei e estou tomando a cada dia com ela e outras pessoas idosas.
A experiência de coordenar com uma amiga um livro com mais de 20 autores para que não perdesse o foco, que tivesse a mínima unidade, foi duro; porém, gratificante. Como estão sendo também nossas rodas de conversas com os lançamentos do livro, em vários lugares diferentes, com gente diversa. E, agora, nosso engajamento no Movimento Sociedade sem idadismo.
O que me levou a escrever este texto agora, desta forma, foi isto tudo, sem dúvida, mas também por uma postagem que li sobre Julia Roberts, refletindo sobre o envelhecimento, com uma lição dadivosa. Sua visão é muito diferente de muitos artistas que buscam manter uma aparência eternamente jovem.
“Estou envelhecendo com dignidade, humor e serenidade… Não apelo para lifting nem Botox, e sei que, nos padrões de Hollywood, isso é um risco para minha carreira. Mas se não quiserem me dar um papel por parecer velha, então produzo o projeto e escolho quem quero. O importante é não levar esse trabalho a sério demais.
Conheço muitas mães que lutam para sustentar suas famílias; esses são os verdadeiros desafios, essas são as mulheres que admiro. São belas e fortes, mesmo quando o peso da vida é imenso.
Honestamente, meus medos são outros… Meu maior temor é por meus filhos, por não poder protegê-los de quem tenta se aproveitar deles. O que realmente importa para mim é que eles estejam bem e que nossa família viva com amor e segurança.
Sou abençoada e sou grata todos os dias pelo que tenho, pelo meu marido, pelos meus filhos.
É por isso que os momentos mais importantes do meu dia não são os que passo no set, mas aqueles ao redor da mesa de café da manhã, conversando sobre a vida. Esses momentos são mágicos.” — Julia Roberts.
Fiz questão de trazer toda a citação, pois aqui temos quase um guia. Viver ao máximo com os seus é o caminho a seguir. Mas nem sempre é fácil, às vezes, até impossível.
O mesmo digo para qualquer pessoa idosa, seja rica, pobre ou remediada. O convívio familiar é essencial, sabendo que este é um grande problema, pois filhos trabalham, moram longe, às vezes em outros países. Nem falo daqueles que descartam os seus “velhos”.
Não tendo a família, muitas vezes, não há mais amigos, pois muitos já morreram, outros estão longe ou simplesmente estão reclusos.
A reclusão para a pessoa idosa é um terror, é sempre o caminho mais curto para a finitude.
Volto ao tema do consumismo. Veja a grandeza da atriz do filme “Uma linda mulher”. Bate de frente com o mito da “eterna juventude”.
Li faz pouco o difícil envelhecimento de outra diva do cinema, Brigitte Bardot. Ela sempre está de cara limpa com seus animais, mas se queixa da velhice e de suas dores.
Esta é a vida como ela é, real, palpável e às vezes dura.
É preciso falar e refletir sobre o envelhecimento, pois o Brasil começa a envelhecer. Da cidade que vivo, Porto Alegre, das capitais tem o povo mais longevo e o maior número de pessoas com mais de 60.
É o caminho... Todos envelheceremos. A morte é um dia bom para se viver, anote o ensinamento da Ana Cláudia Quintana. Prepare-se para envelhecer e morrer. É (d)a vida!
Adeli Sell é professor, escritor e bacharel em Direito.
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